Fui
surpreendido outro dia, com uma lembrança que, a meu julgamento, dá uma medida
no mínimo interessante da “evolução” da arte musical popular e que me levou a
uma reflexão. Não era porque há 55/60 anos atrás não tínhamos como hoje os DJs que
além de comporem (e muito) também mixam, pintam e bordam com as pick-ups atuais que a gente deixava de
curtir um sonzão e dançar muito, nos deixando transportar deste mundo para
algum outro onde só habita a música. Mas a tecnologia, claro, lhes permite
compor trilhas bem originais. Louvores a Tiesto, David Guetta, Fatboy Slim,
Moby, Bob Sinclar e o próprio Zé Pedro (ex DJ dos programas da Adriane
Galisteu). Milagreiros high-tech. Seus "sets" são tocados por DJs do mundo todo
ou baixados de graça na Internet. E tudo isto tem um valor imenso mas, e sempre tem um mas...
Mesmo
assim, quando um cantor ou músico de hoje grava um CD ou registra sua obra (seja
em qual for a mídia) e nos encantamos com seus agudos, falcetes e graves, na
verdade o Auto-tune é que está
fazendo tudo pela maioria dos interpretes , pois corrige até os mais
desafinados. E os instrumentos musicais só
faltam falar. Claro, à custa de computadores e periféricos manipulados pelo
executante. Não se trata de saudosismo, não. Mas na década de 1950, nas
“reuniões dançantes” regadas a Coca Cola e refresco de groselha e que começavam
às 17:00 hrs e que iam no máximo até às 21:00 impreterivelmente, colocava-se um
disco na vitrola, sim. Mas, além de interpretes que faziam tudo no gogó, músico que não fosse músico
mesmo, estava ferrado. Nem saía do chão. Viajando
nesta maionese, lembrei de um astro das reuniões dançantes que fazia muito
mais do que todos os DJ’s da atualidade e, me perdoe o falecido, mais que Ray
Charles. Sim, pois Ray, desprovido do sentido da visão, embora maravilhoso,
usava um instrumento peculiar que, quando a natureza nos agracia com ele,
quando o interprete é um virtuose fica
mais fácil de manejar do que, por exemplo, um órgão.
Hernesto Hill Olvera |
E
o astro a que se refere este post
tocava órgão, era tão cego quanto Ray, mas seu órgão não faltava falar. Ele falava.
Sem computadores, sem softwares, sem
periféricos e sem qualquer outra coisa a não ser o fato de ser eletrônico. Ou
seja, ele falava literalmente na unha.
Só com a habilidade do organista ERNESTO HILL OLVERA. Era um Hammond B-3. Mas
quem era este gênio? Ernesto foi um
músico mexicano nascido em Aquascalientes, em 22 de dezembro de 1936 que aos 7
meses de idade perdeu a visão. Aos 3 anos a família mudou-se para Guadalajara e
aos 6 anos ingressou no Instituto de Capacitação para Meninos Cegos. Aos 12
graduou-se e aos 13 começou a estudar piano e já em restaurantes locais e na
Cidade do México para onde já tinha se mudado em busca de oportunidades. Conta
a lenda que um belo dia o restaurante onde trabalhava comprou um órgão,
instrumento o qual nunca aprendera a tocar. Para tal teve que desenvolver sua
própria técnica. Para chamar a atenção dos amigos desenvolveu uma técnica para
articular seus nomes, que consiste em abrir gradualmente os registros do
Hammond para articular as vogais, com cujo movimento criava as palavras dando a
impressão de um órgão falante. E era com este padrão de bom gosto que se
dançava, que se promovia uma festa de
embalo, tomando no máximo Cuba Libre. Sem funk, sem punk, sem
eletrônica e sem DJ’s. Entre uma e outra de Ernesto Hill Olvera, um Franck
Sinatra, um Bing Crosby e..era isto que a casa oferecia.
Pra quem não conhece, veja se o mexicano era ou não era o cara, na sua interpretação de Vereda Tropical, de Gonzalo Curiel.
Pra quem não conhece, veja se o mexicano era ou não era o cara, na sua interpretação de Vereda Tropical, de Gonzalo Curiel.
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