sábado, 2 de outubro de 2010

Eu e Fred Flintstone

Dublar um personagem famoso deve ser o céu e o inferno na vida de um dublador  – a estrela que não brilha, empresta o brilho.  Depois de personificar aquela voz, pegar uma caroninha na fama... e se mudam o dublador? é aposentadoria forçada, em se tratando de memória auditiva, rapidinho ninguém mais lembra.
Marthus Matias, ator e dublador (do Fred Flintstone) morreu em Campo Grande em 1995, de câncer – talvez desgostoso pelo ostracismo. Se o conheci pessoalmente? Mais ou menos. A Hanna-Barbera entrou em minha vida no fim dos anos 80. Desenhava e licenciava personagens “HB” quando desenvolvi para um cliente uma idéia: a Familia Flintstone ia desfilar por Porto Alegre no Dia da Criança. O evento não vinha sozinho, teria o suporte de comerciais de televisão, promoção em locais públicos, uma verdadeira festa.
No briefing pro cliente, precisava desesperadamente achar a voz do Fred. Queria usá-la no fechamento do contrato, nos comerciais, nos spots de rádio. Onde achá-lo? “Tá aqui o telefone dele, em Mococa, Interior de São Paulo”, disse por telefone Attiliano Martins, nosso Gerente de Marketing.
Peguei o telefone, respirei fundo e liguei – “Por gentileza, posso falar com o Sr. Marthus?” Uma voz feminina no fundo chamou “- Fred, é pra você!” – meu coração disparou.
- Alooou! Quem me procura?
Gelei do outro lado. Estava vivendo uma experiência – foi meio segundo enquanto eu não respirava e “Fred Flintstone”, em pessoa, me aguardava do outro lado do Brasil. Passado o susto, disse o quanto admirava a história dele, mas tudo o que eu dissesse não ia traduzir o que estava acontecendo. Contei o projeto – Marthus não acreditava que se abria possibilidade de voltar a dublar o Fred. Os 166 episódios antigos que se via na TV nunca mais deram chance ao guerreiro, não surgiu um comercial sequer onde pudesse voltar a brilhar – meu projeto acendeu a chama daquele senhor-lenda. Falamos por 30 minutos e todas as “gags” foram repetidas, os “yahbadahbadoos”, tudo ao vivo, ali mesmo. Combinamos falar para acertar tudo, mas dias depois, o plano Collor deixou o desfile do Flintstones na lembrança - eu e Fred Flintstone só voltamos a falar quando lhe dei a notícia. Fizemos um pacto de que um novo projeto surgiria, mas não pude realizar seu desejo. Pensei que ouviria aquela voz no longa metragem em 1994, mas não era ele. Nova decepção. 
Marthus, saúde e paz, esteja onde você estiver – nesses 50 anos de Flintstones, saiba que nunca esquecerei de você. Yahbadahbadooo!

Um comentário:

  1. Dani,

    Flintstone está escrito de várias formas ao longo do texto e nos marcadores. Sei que o original é como está no título, apesar do "abrasileirado" ser como está na figura (Flinstone).

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